segunda-feira, novembro 26

a décima sexta tormenta.



Haviam me dito que poderíamos nos perder no meio do processo.

Que nos acostumaríamos com nossas presenças em um nível onde pudêssemos estragar tudo o que vivemos pra chegar ao costume. Que não teríamos sobre o que falar em algum ponto. Que ter que dividir a vida se tornaria um peso quando tudo estourasse. Só que eles estavam errados; como costuma acontecer a basicamente toda pré disposição de palavras opinativas.

Acostumei com sua presença, mas não estragou nada: acostumei ao ponto de me sentir confortável em falar sobre pesos meus, a ouvir sobre pesos seus, a entender pesos nossos; acostumei ao ponto de expor os medos, os desejos, os receios e saber que eles seriam, se não compreendidos, ao menos levados em conta; acostumei ao ponto de saber qual será sua próxima fala ou entender que algo te incomoda tanto (ou tão pouco) que você não quer falar sobre naquele momento. Acostumei, mas foi um costume que me levou a conhecer e ser conhecida. Um costume que me dava certeza da falta de monotonia ou da leveza que uma monotonia nos trouxesse.

Sobre não ter o que conversar... Ah, que bobos. As melhores teorias do mundo foram feitas em noites que estávamos no quarto, em dias que cozinhamos o tempo todo, em tardes que víamos horas e horas seguidas de filmes que depois esquecíamos do nome mas lembrávamos da história. E o silêncio que vem entre uma teoria e outra não é desconfortável. Há sempre sua mão em mim esperando a próxima; minha mão nos seus cabelos procurando te dar conforto depois de um falatório longo; seus olhos nos meus, por cinco segundos, depois de um sexto inteiro de volta do relógio sem que nos olhássemos diretamente; meus olhos em seu perfil só pra saber se, mesmo com o silêncio, você ainda está lá.

E peso? Foi a coisa mais boba que eu ouvi na minha vida inteira. Quando nos conhecemos, você me disse que era mais produtivo dividir o peso do mundo com pessoas que você confiava do que carregar ele sozinha. E nós colocamos isso como um pré requisito que ninguém deu certeza sobre o cumprimento; só existe. Não há peso em dividir com você as teorias mais pesadas, a parte mais suja, a loucura mais insana, o problema mais absurdo do mundo. Não há peso em te ouvir e tentar ajudar sobre as coisas mais triviais ou mais cruciais que perpassam ao seu redor. Não há peso, nunca houve. E dificilmente darei razão a eles dizendo que num futuro próximo possa existir.

O que eles esqueceram de comentar quando colocam essas regras absurdas em amores, quando tentam impor uma maldição que te dá prazo pra ser feliz, é que regras são feitas para serem excedidas, quebradas. Eu, você e mais um monte de teimosos não precisamos escutá-los. Apenas existir e provar que estão redonda e profundamente enganados.

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