segunda-feira, novembro 26

a décima sexta tormenta.



Haviam me dito que poderíamos nos perder no meio do processo.

Que nos acostumaríamos com nossas presenças em um nível onde pudêssemos estragar tudo o que vivemos pra chegar ao costume. Que não teríamos sobre o que falar em algum ponto. Que ter que dividir a vida se tornaria um peso quando tudo estourasse. Só que eles estavam errados; como costuma acontecer a basicamente toda pré disposição de palavras opinativas.

Acostumei com sua presença, mas não estragou nada: acostumei ao ponto de me sentir confortável em falar sobre pesos meus, a ouvir sobre pesos seus, a entender pesos nossos; acostumei ao ponto de expor os medos, os desejos, os receios e saber que eles seriam, se não compreendidos, ao menos levados em conta; acostumei ao ponto de saber qual será sua próxima fala ou entender que algo te incomoda tanto (ou tão pouco) que você não quer falar sobre naquele momento. Acostumei, mas foi um costume que me levou a conhecer e ser conhecida. Um costume que me dava certeza da falta de monotonia ou da leveza que uma monotonia nos trouxesse.

Sobre não ter o que conversar... Ah, que bobos. As melhores teorias do mundo foram feitas em noites que estávamos no quarto, em dias que cozinhamos o tempo todo, em tardes que víamos horas e horas seguidas de filmes que depois esquecíamos do nome mas lembrávamos da história. E o silêncio que vem entre uma teoria e outra não é desconfortável. Há sempre sua mão em mim esperando a próxima; minha mão nos seus cabelos procurando te dar conforto depois de um falatório longo; seus olhos nos meus, por cinco segundos, depois de um sexto inteiro de volta do relógio sem que nos olhássemos diretamente; meus olhos em seu perfil só pra saber se, mesmo com o silêncio, você ainda está lá.

E peso? Foi a coisa mais boba que eu ouvi na minha vida inteira. Quando nos conhecemos, você me disse que era mais produtivo dividir o peso do mundo com pessoas que você confiava do que carregar ele sozinha. E nós colocamos isso como um pré requisito que ninguém deu certeza sobre o cumprimento; só existe. Não há peso em dividir com você as teorias mais pesadas, a parte mais suja, a loucura mais insana, o problema mais absurdo do mundo. Não há peso em te ouvir e tentar ajudar sobre as coisas mais triviais ou mais cruciais que perpassam ao seu redor. Não há peso, nunca houve. E dificilmente darei razão a eles dizendo que num futuro próximo possa existir.

O que eles esqueceram de comentar quando colocam essas regras absurdas em amores, quando tentam impor uma maldição que te dá prazo pra ser feliz, é que regras são feitas para serem excedidas, quebradas. Eu, você e mais um monte de teimosos não precisamos escutá-los. Apenas existir e provar que estão redonda e profundamente enganados.

terça-feira, outubro 9

a décima quinta tormenta.



a primeira vez tinha uma música de fundo
o silêncio da noite
olhos focados uma na outra
e o amor entre nós.

o sentimento transbordava
ao ponto de sair em lágrimas
em sorrisos
em carinhos.

amor, foi o primeiro motivo.

a segunda vez tinha fogos intrusos de fundo
o barulho da noite
olhos focados em uma tela que anunciava coisas terríveis
e o desespero entre nós.

o sentimento transbordava
ao ponto de sair em soluços
de incredulidade,
de medo.

desespero, foi o segundo motivo.

quinta-feira, julho 5

coisinhas que trazem conforto.


lola.
entender referência, principalmente de coisas que gosto.
quando meus amigos me chamam pra fazer algo pela décima vez porque enrolei nas outras nove.
gente que não me acha doida de viver no chão e senta no chão comigo.
quem divide cigarro.
quem não insiste em saber o motivo de estar mal mas te dá colo.
gente que te faz ver um filme que cê acabou de ver e te faz aproveitar.
doctor who.
guia do mochileiro das galáxias.
gilmore girls.
before sunrise.
cabelo hidratado e com raiz retocada.
se sentir prioridade, mesmo que só dure uns instantes.
saber que você importa, mesmo que só sinta isso às vezes.
sentir que suas reclamações são válidas e não serão vistas como drama.
coca cola depois de um pratão de comida.
conseguir comer depois de a gastrite ter atacado - sem vomitar ou ter ânsia.
receber elogio da endócrino.
elogiar alguém na rua, esporadicamente.
fazer o seu humor mudar, sozinha, porque notou que tá braba sem motivo.
ver vídeos no yt das nene que eu amo.
não me decepcionar com gente que me inspira.
me decepcionar com gente que amo e passar por cima disso.
ser decepção pra gente que amo mas receber amor mesmo assim.
brigar e ficar de boa dois minutos depois.
receber atenção quando brigo porque não tô tendo ela.
quando notam uma besteirinha na minha personalidade que achei que ninguém notava.
quando me elogiam falando coisas tipo iluminada ou piriri sua alma ou pororo energia.
comidas salgadas.
acordar cedo sem necessidade.
dormir mais de doze horas e não sentir culpa.
viajar com os amigos.
sentir liberdade pra rejeitar algo e não me sentir mal.
star wars e lotr.
ficção científica de qualquer gênero, vou me resumir.
gente que me dá conforto pra mandar o que escrevo.
parques, bosques e todos os lugares verdinhos que me fazem querer ser vegana e não fumar nem cigarro de chocolate.
casimir pulaski day.
gente que te faz playlist.
"vi sei lá o que e lembrou você".
quem passa por cima do orgulho por você.
quando o cabelo fica cacheado o dia todinho, não importa o que você faça.
f r i e n d s.
entrar no fb e ter marcações dos bbs.
g r e y s.
cheiro de café feito na hora junto com terra molhada.
gente que fala sobre algo pelo qual ela é apaixonada.
andar de bicicleta.
cerveja na segunda.
cerveja na sexta.
gente que "tá ocupada? vem aqui pra casa" ou "deixa eu te ligar".
gente pra qual você dá conforto.
incensos.
meditação.
colocar música de yoga pra dormir.
filmar os migos quando tão chapados ou bêbados e só lembrar desses vídeos dias depois.
mandar textão sobre um assunto e ser respondida com textão.
bolo da feira de sexta.
salgadinho em dia que não tenho aula.
ter lido todos os textos de turismo e quase todos de metodologia.
quando elogiam algo que escrevi.
quando confiam em mim pra mandarem algo que escreveram.
gente que ri com escândalo.
roupa limpa.
fim de domingo.
quando meu time ganha e não têm como me zoarem.
salada com tempero e frango.
o feijão da minha vó.
a mistura da minha tia - e quem fala mistura.
dormir sem precisar ligar o ventilador.
ficar sozinha por horas e não surtar com isso.
fazer qualquer coisa sozinha e apreciar sua companhia.
ter ignorância sobre coisas que você agradece por não saber.
quando riem da sua risada.
quando a risada de alguém te faz rir.
gente que oferece comida. e insiste pra você pegar.
família e quando cê descobre que tem gente nela que salva.
meu irmão.
minha mãe.
meu pai.
saber separar a eu brava da eu que precisa te dar conselho agora.
ser tão ponderada que até dá raiva mas me permite estar certa sempre.
roupa nova.
achar dinheiro.
cheirinho de gente que fica na sua casa.
assistir série com alguém.
dormir na casa de amigo e não se sentir esquisita caso ele durma primeiro e te deixe sozinha.
chooker.
box de livros.
sebos.
artigos hippies.
quando a letra sai bonitinha de primeira.
quando cê entende uma matéria super difícil.
histórias do insta com pagação de mico que mais te fazem rir que passam raiva.
pão na chapa.
choppada.
ficar bêbada mas lembrar de tudo.
post its.
quadros.
fotos que tiraram de você sem que você veja e que ficam bonitas.
gente que te ajuda, com tudo, sem você pedir.
traduções literais que não ficam ruins.
quando você fica de tpm junto com alguém e a braveza de uma alivia a da outra.
fazer as pazes.
lembrar do trecho de um livro/filme/série certinho.
quando pegam suas manias.
falar piriri pororo.
falar blo blo blo.
falar como é mesmo o nome?
falar tenha dó.
ter pego mania de rapariga.
quando riem de mim porque tô braba - sendo que?
quando eu desabafo comigo e consigo ficar de boa.
travesseiro novo que se encaixa em você.
abraços longos sem motivo.
"saudades, vamo sair qualquer hora" e realmente sair.
gente que não muda com você, independente de qualquer coisa.
ônibus que chega no horário.
chegar na parada e sair o ônibus.
marlboro vermelho.
pirulito de morango com o troco do marlboro.
ver uma temporada todinha de uma série e nem ver o tempo passar.
gente que te mima de g r a ç a e te mostra que te quer perto.
ouvir música na caixinha, bem alto, na hora do banho.
saber as coreografias do fit dance.
não ter recaída com anorexia.
nem crise de pânico
me permitir mudar e aceitar quem eu sou, cada pedacinho, porque eu sou importante - ao menos pra mim.
chuva assim que chego em casa.
dormir fora e receber carona pra voltar.
quando fazem questão que eu saia junto e me buscam no inferno onde moro que é longe p cacete.
xingar.
gente que fica brava junto com você.
jogos de celular.
bater recorde.
bater recorde em cima de alguém que tá jogando contigo.
carl sagan.
tv cultura e seus programas lindos.
chorar porque algo me emocionou e estar nem aí p paçoca.
quando acertam meu signo de primeira.
quando sentam na mesa de bar comigo pra conversar e não dar em cima.
gente que é aberta.
gente fechada que é aberta com você.
conseguir colocar em um texto todas as suas ideias.
tumblr.
weheartir.
brega que eu sei cantar.
quando a @ dos migos querem entrosar comigo.
p a p e l a r i a.
dormir à tarde.
"nossa série".
achar textos que dizem tudo o que você queria dizer.
quando o google indica app de meditação, organização e joguinhos ótimos.
quando meus canais favoritos liberam vídeos juntos.
saber cantar dona gigi inteira.
luzes pisca pisca.
abajures.
já disse quadros?
quando a lola brinca comigo e se nega a me entregar o brinquedo de primeira.
gente que te liga pra você responder logo.
quem cobra atenção - mas eu tenho que te amar pra ver isso de modo fofo.
ônibus vazio.
pão de queijo e pão com queijo.
"eu vou com você".
"eu te ajudo".
sorvete de passas ao rum, maracujá ou qualquer coisa azedinha.
picolé de cupuaçu.
vitamina de cupuaçu.
cupuaçu.
fazer exercícios mais de duas semanas seguidas.
criar novos hábitos.
sair da rotina.
gostar da rotina que você criou.
ler um livro todinho numa tarde.
quintas feiras.
bandas desconhecidas.
músicas desconhecidas de bandas conhecidas.
gente que te stalkeia e admite.
admirar alguém sem nunca ter conversado com essa pessoa.
sentir carinho, de graça.
ser querida, de graça.
simbologia.
gente que se encaixa com você de primeira.
para cima e não para o norte.
humanas.
biológicas.
um pouquinho de exatas.
gostar de usar sutiã mas não me incomodar com não usá-lo.
cheirinhos gostosos.
por do sol.
nascer do sol.
sol ao meio dia quando dá pra ver a lua junto.
saber os nominhos das nuvens.
e um cadinho sobre estrelas.
carros pequenos.
miniaturas.
livros velhos mas bem conservados.
anéis.
colares.
vozes que te trazem paz.
pessoas que te trazem paz.
gente que não torna seu silêncio constrangedor.
viajar sozinha.
óculos de sol. um monte.
cremes corporais.
cremes de cabelo.
perfume novo que é melhor que o antigo.
contar uma piada e fazer todo mundo rir.
ser irônica e entenderem.
entender uma ironia que ninguém entendeu.
piada interna.
gíria interna.
coisas favoritas.
coisas favoritas em comum.
coisas que só têm sentido pra você.
listas.

quinta-feira, março 29

a décima quarta tormenta.

Eu, por mim, te dava
a casa,
o corpo,
a alma.

A estadia
ou a passagem de volta.
O direito de trancar
e abrir aquela porta.

Por mim, te dava
a mim, a ela e a outra.

Por mim, te deixava voltar
até mudaria os termos:
mesma coisa de sempre, sem receios,
você, eu e - talvez - alguns rodeios.

Por mim, te dava tudo outra vez.
E mais.
Te dava tudo o que não dei.
Ou menos.

Mas pra você, a casa, o corpo e a alma
é uma oferta alta.

Talvez só o corpo e em alguns dias a casa.
Talvez só a casa e em todos os dias o corpo.
Só pra eu ser o líquido da vez que preenche seu lado oco.

terça-feira, março 20

a décima terceira tormenta.

Chega a ser problemática a forma como sua lembrança me assola diariamente. Há meses não sei o que te ver e ter uma conversa sincera contigo (de amiga pra amiga, colega pra colega, talvez até aquele conversa iniciada de forma arrastada entre pessoas que quase tiveram alguma coisa que as abalassem demais); há meses não dou corda pras suas mensagens em dias aleatórios puxando papo em algum lugar (dias esses que sempre coincidem com suas más épocas, ironicamente).

Não te quero de volta.

Agora, longe, resolvida quanto ao fato de que você - e o quase nós - se foi, não sei se aceitaria sua bagunça de novo. Seus medos e inseguranças disfarçados de uma necessidade de holofote que na época eu não entendia; sua risada escandalosa; seu jeito notável a quilômetros de distância; sua forma de marcar presença (mesmo quando não queria a atenção pro seu rumo). Eu adorava aquilo tudo, me encantei por aquilo tudo, mas não te aceitaria de volta. Seu jeito não é honesto nem com você, imagine comigo.

E eu entendo.

As risadas, a necessidade de estar cercada, a carência de aconchego dos que lhe são queridos, a necessidade de resolver amores passados e ao mesmo tempo buscar por novos - ai voltar para os novos que não são novos mais quando os antigos deram errado. Entendo, mas não estou disposta a entrar nisso de sentir com você outra vez.

Antes, confiava quando você me coloca como sua prioridade. Quando me fala que eu mexia com você, que te tirava da zona de conforto e todas aquelas coisas que pareciam carinho na alma. Não seria capaz disso agora. Estava disposta a me entregar totalmente pra você quando você desperdiçou a chance.

Hoje, não o faria. Hoje não te aceitaria por inteiro de novo.

Mas te aceitaria, talvez, pela metade; quem sabe um terço.

Aceitaria na medida necessária pra te chamar pra casa uma vez mais - ou o plural disso. Aceitaria o suficiente pra aceitar fingir que esqueci de tudo e enrolar o fim mais um pouco.

quinta-feira, março 1

a décima segunda tormenta.

Me assustou sentir suas marcas quando alguém com o mesmo perfume que você usava passou ao meu lado.

E veio tudo tudo de uma vez:

o riso
o toque
o jeito bobo de me olhar quando achava que eu não estava vendo
a mania de frisar pra todo mundo que eu te fazia sentir (sentir o quê eu nunca soube)
os áudios com longas declarações ou curtos cheios de gritaria de rolês que não pude ir
o julgamento seguido de surpresa em momentos que eu era carinhosa.


Tudo, num flash, numa suspirada quando a pessoa com o cheiro errado cruzou meu caminho.

Mas era só isso: um susto.

Um pensamento rápido seguido de um riso de lado que me fazia pensar nas possibilidades e nos "e se" caso estivéssemos dispostas.

segunda-feira, fevereiro 19

a décima primeira tormenta.

É como se morrer agora, exatamente às 15:01 de uma tarde de segunda feira, não fizesse diferença.

Poderia pensar por dois minutos que sentiria falta dos meus amigos e família, que não fiz tudo o que deveria fazer, nem vi tudo o que queria ver. Que não sai do meu país e não tive um amor de verão que possa contar em alguma mesa de bar pensando no que teria acontecido se o verão durasse mais de três meses. Poderia pensar que reclamo com tudo na mão, que eu faria falta pra alguém, que eu poderia desestabilizar alguma coisa.

Mas sabe quando não basta?

Não basta fazer falta. Eu pensar que minha presença pode ter importância pra meia dúzia de pessoas não é suficiente pra me manter aqui. Não digo isso com desdém quanto a ser querida; não, de forma alguma. Só não basta. Amor, por si só, não basta. Nunca bastou. Nem esse tipo de amor fraterno, sem cobranças, cheio de carinho que uma família e amigos podem oferecer. Não basta.

Sonhos, querer e lutar muito por algo... São coisas que eu não sei qual é a sensação. Não tenho sonhos. Não sei o que deveria fazer. Não tenho um plano, um objetivo ou algo que queira realizar antes das 15:10. Me voluntariar em uma ONG, viajar pelo mundo, conhecer pessoas... Parece clichê e algo não meu. Seria ótimo fazê-los, mas não sei se seria o suficiente. Me formar, ser reconhecida, ter prestígio no ramo que eu escolher seguir me parece ridículo. Eu seria uma profissional no máximo mediana, talvez diferente pra alguns que tivessem um olhar mais cuidadoso. E é triste. Às vezes, tudo o que poderia me fazer ficar seria algo no qual focar. Não sei, um desejo puro e individual igual ao de algumas pessoas por aí: abrir um comércio pequeno cheio de histórias; ficar de férias por seis meses e visitar qualquer outro estado que não o seu; ser apaixonada por outra cultura ao ponto de só o fato de ela existir na mesma época que você já de dar aquela motivação diária, aquela vontade de ficar.

Vontade de ficar. É isso.

Eu não tenho vontade. A qualquer hora, com qualquer sonho de um mês que eu tenha, eu poderia ir. A qualquer hora, com qualquer pessoa estreando no palco da minha vida, eu poderia ir. A qualquer hora, independente do que estivesse acontecendo. Eu iria. Pra falar que não iria imediatamente, talvez pegasse cinco minutos pra fazer alguma coisa boba igual um condenado à pena de morte: comer algo diferente, observar o céu de um jeito que eu ache nunca tenha feito ou meditar, quieta, sozinha. Mas poderia ir depois, eu juro.

Porque o que eu tenho, o que eu sou não me basta. E não consigo ver alternativas que me façam suficiente.

quarta-feira, janeiro 24

a décima tormenta.

Eu tenho certeza que vou morrer de saudades suas em alguns dias.

Que haverá dias nos quais eu vou querer correr pro seu colo,
dias nos quais eu irei reler coisas que você me escreveu,
dias nos quais parecerá que aquela determinada conversa só teria lógica sendo feita com você,
dias nos quais eu irei te stalkear só pra saber como sua vida está,
dias nos quais eu vou quase - quase - me arrepender de ter te deixado ir.

Mas eu sei que esses dias serão raros. Você já foi absurdamente importante pra mim, importante ao ponto de eu não saber o que era acontecer algo na minha vida e você não saber sobre isso uns minutos depois. Mas você optou - o p t o u, foi escolha sua mesmo - se tornar indiferente. Sumiu, me machucou inúmeras vezes com uma baixaria, com uma vontade de machucar que a gente não deveria ter com quem ama. Se tornou opcional você saber ou não o que fiz ou o que quero; opcional eu entender você e saber do seu dia. Opcional, pois você fez questão de deixar as coisas assim.

Por um lado, eu deveria agradecer. Só na sua ausência eu notei o tanto de coisas que aceitei vindas de você e que não deveria ter aceitado. Nunca. Deveria ter me imposto ou ido embora há muito tempo. Só que tinha algo viciante na sua companhia e eu não sabia o que era. Talvez, só talvez, você estivesse certa ao falar que eu não conseguia ficar sozinha, pois criei uma dependência maior de você exatamente nos meus piores momentos. E desculpa por isso, ninguém deveria ser usado como muleta.

Sei que te ajudei na sua pior fase e você tentou me ajudar na minha em todos os momentos que não estava me colocando pra baixo (o engraçado é me questionar se você se dava conta do quão pra baixo me colocava ou se era uma brincadeira da sua parte). Só que você se tornou uma memória. Eu sei disse porque reler o que você me escreveu parece ler algo de alguém que não conheço escrito pra outra pessoa que não sei quem é. Tudo vazio, sem sentido, sem a menor verdade no meio dos fonemas. Você optou por fazer com que as minhas saudades sejam tão rápidas e reflexivas que eu sinto saudade por um minuto e no próximo já lembro que você não estaria presente nem se estivéssemos conversando, que provavelmente estaria brigando comigo por alguma coisa ou me culpando por algo que não fiz. E eu lamento tanto, tanto por isso.

Uma das piores coisas que você me disse foi que, se todo mundo se afastava de mim, o problema era eu. Sei que serei a milésima pessoa que vai passar pela sua vida, ter uma conexão forte e ir embora por besteira sua. Eu sei, você me contou de todas as outras que passaram antes e eu fiz o impossível pra ser a exceção. Mas se todo mundo se afasta de você...

domingo, janeiro 21

a nona tormenta.

Ao mesmo tempo que foi meu karma, você foi minha comprovação de mudança.

Nossas conversas não eram contínuas, mas parecia que não precisávamos disso. Você viria me ver e passaríamos o ano novo juntos. Eu estava tão empolgada: tínhamos feito lista do que fazer, como fazer e eu já tinha desmarcado tudo com o mundo naquela semana pra ter mais tempo pra você. Todo mundo estava sabendo da minha animação pra te ver. Ai, pouco depois de um parabéns forçado, você sumiu. As contagens dos dias que faltavam pra você aparecer aqui eram feitas só por mim agora. Os links dos eventos eram enviados só por mim. E a conversa? Era um monólogo meu também.

Sumiu.

Não de todo lugar, não das redes sociais ou das outras pessoas, mas de mim. Eu me tornei mais uma na sua lista de visualizadas e não respondidas e eu não entendia o porquê. Não entendo ainda. O que tenho são só conjecturas sobre o que pode ter acontecido. Só que eu não me afastaria de você.

Não me afastaria porque eu fui você em outra situação e você foi o check que eu precisava pra ter certeza que mudei. Eu fui atrás depois, inclusive. Várias vezes. Te perguntei se estava tudo bem, se você continuaria só me visualizando. Te desejei feliz ano novo e parei. Não porque não acho que você valha a pena, mas porque não entendo. Não sei se fiz algo, falei algo ou se foi por coisa sua. Você nunca me explicou. Se o karma acontecer direitinho, talvez daqui um tempo você comece a desabafar em textos e venha no meu privado esporadicamente tentar se explicar.

E eu vou entender.

Mas não pense que vou agir de boa, porque não vou. Eu te entendo e ainda te quero comigo, mas estou brava pra caralho com você. Puta mesmo. E tem muitos meses de frustrações e perguntas dentro de mim pra você ouvir antes de ouvir que estou com saudade e antes de me ouvir agradecer por ter me machucado tanto. Porque eu não concordo com aquilo de que não devemos agradecer alguém que te destruiu porque essa pessoa te tornou mais forte. Tem arroubos que valem o estrago.

Eu só te peço que, se tiver que vir, venha logo. O nosso temperamento é parecido até nessa mania ridícula de querer afastar quando nos amam de verdade, mas siga um último conselho: não faça isso. Fale que se arrependeu e não me deixe seguir em frente. Não me deixe ir. Não me deixe parar de te amar. Eu entendo você me magoar, entendo sua insegurança acabar refletindo em frieza e eu entendo se tiver magoado você de alguma forma pra que isso tenha acontecido, mas não dá pra forçar alguma coisa se você optar por se tornar indiferente.

sábado, janeiro 20

a oitava tormenta.

O engraçado é que jamais me pensei como alguém que não superava. Que meses depois ainda pensa em alguém porque vê algo que lembra ela, algo que ela com certeza gostaria ou que comentaram juntas na época em que conversavam. E eu te falava isso do mesmo jeito que você me falava. A gente não era do tipo que não superava - esse foi o início de muitas conversas e reflexões nossas; um dos inúmeros quesitos nos quais a gente batia e conseguia se entender.

Mas me tornei essa pessoa. A que não supera. A que não consegue deixar ir porque todo dia - todo bendito dia - vê algo que lembra você, ouve algo que você gostaria de ouvir, lê algo que a gente compartilharia e seria aquele negócio engraçadinho de "ah, eu vi, já ia te mostrar". Só que não tem mais graça. O que tem é um buraco, enorme, que nada preenche. Que ninguém preenche.

Acho que não fazia ideia do espaço que você ocupava até você ir embora. Não fazia ideia da importância que você tinha até eu não ser mais importante pra você. Não tinha noção do quanto ser a pessoa que não supera é pesado, difícil, desgastante até que me tornei a pessoa que fala de você pra quem quiser ouvir. Não é que não te valorizasse ou coisa do tipo. Lá no fundo, se eu fosse ter que achar um porquê, acho que queria não ter uma exceção. Não queria que você fosse a minha exceção pra regra "sou uma pessoa que supera", mas você é. E o problema não foi só eu ter ido embora, foi ter preparado o território pra não voltar; ter te magoado pra eu não ter chance de ter uma exceção à regra. Foi ter me sabotado e te desolado na mesma tacada.

Todo mundo sabe que a culpa foi minha. Todo mundo sabe quem é você, o que eu fiz e o quanto isso acaba comigo. Todo mundo, pode perguntar por aí. Eu me tornei a pessoa que não supera e tá tão estampado na minha cara que, do nada, me perguntam "e a fulana?" ou me questionam se você é o motivo de eu estar mal. Eu, logo eu, virei essa pessoa. Se me falassem isso há um ano atrás eu riria, acharia o cenário impossível. E cá estamos.

Esse foi o seu gesto mais altruísta: me fazer mudar. Não me achava imutável ou qualquer coisa do tipo antes de você - "antes de você", tem esse outro detalhe na minha vida agora -, mas você modificou coisas que eu achava intrínsecas a mim; coisas que eu só consegui mudar porque você me fez ver que eram necessárias (e fez isso, ironicamente, quando não estava mais aqui e sem dizer uma palavra). Comecei a me policiar tanto com algumas atitudes que parece que te tenho como uma memória, rebobinada constantemente na minha cabeça, do que não fazer, de como não agir e de como não tratar alguém.

Mas tudo bem. Há mudanças que as pessoas não são obrigadas a aceitar e riscos que não são obrigadas a correr; eu sou um deles. No meio de toda essa bagunça, o que eu espero é que você ache um colo e alguém que te dê conforto. Eu sei que te tirei um colo, da mesma forma que perdi. Que te tirei um conforto, da mesma forma que me parece impossível achar alguém em todo esse mundo com o qual eu fique totalmente relaxada. Mas você é alguém que merece se sentir abraçada e segura continuamente, principalmente quando tiver aqueles pensamentos bobos e sem fundamentos que passam por essa cabecinha ou quando achar que é a pior pessoa do mundo - tá longe de ser, tem um limbo enorme entre você e as piores pessoas.

[...]

Não. Pensando bem, estou um pouco longe desse estágio ainda. No fundo, tudo é uma tentativa desesperada de ainda ser um colo pra você.

(eu disse que me tornei a que não supera?).

domingo, janeiro 14

sétima tormenta.


Ultimamente o meu passatempo é deixar tudo aqui dentro o mais bonito, sincero e confortável possível na esperança de que um dia você volte e possa ver.

E isso me mata pouco a pouco da mesma forma que me fortalece.

Não há previsão da sua volta, tampouco certeza se ela ocorrerá. Posso esperar por outros meses e esses meses se desdobrarem em anos na doce ilusão de que um dia terei você por perto de novo, mas não sei se suas palavras foram sinceras. Não me veja mal, não quero dizer que duvido do que você me falava ou de suas promessas - duvidar de você me parece tão inviável quanto alcançar lugares altos. Só que eu sei que você duvida das minhas.

A sua dúvida quanto ao que falo e sinto é o que nos afasta. E eu queria que a culpa fosse sua por isso (seria um conforto; na incapacidade de admitir meus erros e culpas, acabei por colocar tudo sob sua guarda e criar essa situação. Por vezes, a única coisa que queria é ignorância quanto a antigas atitudes de modo que eu possa ficar confortável com elas de novo. Leigo engano, uma vez que estamos cientes dos erros e vícios - como o de externalizar o problema e não entendê-lo como seu - é difícil, se não impossível, ignorá-los) e esse acaba por ser mais um tópico na lista dos itens pelos quais te devo desculpas.

Mas vê que seria mais fácil? Se a culpa fosse realmente sua, eu me desculparia por tê-la afastado e você se desculparia por ter me magoado se alguma forma. Se você tivesse alguma culpa, a balança estaria equilibrada e tudo poderia ser perdoado, poderíamos seguir. Mas ela pende pro meu lado. Totalmente. A culpa é minha em todas as situações que me recordo e as desculpas que me foram dadas vindas de você não foram mais do que educação da sua parte, pois você não as devia pra mim.

Tento arrumar tudo de modo a parecer seguro pra você me visitar de novo.

Há um texto seu - escrito pra mim, na época em que era sortuda e parecia não me dar conta - no qual você descreve sobre como é andar de mãos dadas comigo. Há uma parte que diz, e aqui irei parafrasear pra não cometer o erro de expô-la, que você não sente medo que eu largue sua mão, pois sabe que uma hora eu volto por sentir saudade de ti durante todo o tempo em que não estava com sua mão na minha e que você estará lá pra mim.

Me dói. Me rasga por dentro todas as lembranças que tenho de você e toda a saudade que me consome de não te ter por perto. De saber do seu dia apenas alguns resquícios, de entender de você e suas mudanças apenas o pouco que você expõe. Me acaba ter soltado sua mão e não voltado no minuto seguinte. Me desgasta andar sozinha e não ter você por perto pra apreciar a bagunça e confusão que é a vida e o tanto que isso a torna bonita. Me desola não saber das suas aflições e não ter ideia dos seus atuais receios.

Piora toda a situação não conseguir te culpar. Por coisa alguma. Arrumar tudo e tentar ser a melhor versão de mim ciente de que você pode não ter interesse em ver e saber o que foi mudado. Reler tudo incansavelmente ciente de que você pode nem mesmo se lembrar do que escreveu e, se reler o que foi escrito, não ter o mesmo significado pra você. Sentir exatamente o mesmo amor que sentia quando te deixei ir e não ter ideia da reciprocidade (ou da falta dela).

Mas tento conviver com isso. Com todo o esforço ser em vão e você não voltar. Ou com o fato de você se sentir confortável apenas passando por aqui e indo embora assim que se lembrar de tudo o que te privou de ficar. Com não poder participar da sua vida. Com não ser agraciada com seus devaneios. É horrível, às vezes me parece um fardo maior do que a consequência que mereço, mas eu convivo e tento atingi-la o mínimo possível quando não consigo conviver. O que realmente me destrói é saber que só a indiferença pode te trazer de volta.
© terna tormenta
Maira Gall