terça-feira, dezembro 19

a quarta tormenta.


Se você fosse uma folha em branco, seria aquelas amareladas pelo tempo, amassadas por excesso de manuseio e com marcas de borracha e lápis devido ao que já escreveram em ti. E, quando falo isso, não digo com a intenção de te ferir ou causar estranhamento. Você só aparenta ser assim: marcada.

E é até compreensível que o fosse. Todos somos. Mas, veja só, é importante saber de algo:

Na casa que é seu coração, sempre pronto pra receber visitas, a bagunça entre um estranho e outro é constante. Você não se dá tempo para arejar a casa, lavar o que está sujo, limpar os móveis, trocá-los de lugar, ter plantas, organizar os livros por ordem de leitura ou alfabética, coar um café ou comprar uma bebida fria. A pessoa que está te visitando no momento tem sempre o trabalho de te levar comida e ajudar a fazer com que a sala, apenas ela, fique confortável durante a sua tarde de estadia.

Ai, quando ela se vai, você se pergunta o porquê.

[por que não ficam? Por que não insistem? Por que não visitam os quartos ou pedem para usar o banheiro? Conhecer a varanda, sei lá. Pedir algo pra comer. Passar a noite, uns dias. Cozinhar algo pro almoço e acabar comendo fora - por consenso, não por desgaste da bagunça].

E é fácil te responder; acho que você mesma já sabe a resposta. Não há muitas bagunças que te façam ficar e você nem sempre tem paciência pra ir ajudar alguém a colocar a casa em ordem. Entende?

Você vem cheia de marcas e bagunças e espera que todos os outros te ajudem com ela. Mas poucos são capazes de entender qual o melhor produto de limpeza pra você ou onde os móveis te trazem conforto ao ponto de você não tropeçar neles caso acorde de madrugada e não acenda as luzes para tomar água. Nem você - mesmo nos seus melhores dias e com a melhor intenção em ajudar - consegue saber isso sobre todos os demais.

Porque a sua bagunça - se for a bagunça que você quer - precisa ser aconchegante (pra você, primeiramente).

Provavelmente você vai perceber que há sua própria ordem no meio do caminho e que é preciso se dar tempo para arrumar a casa entre uma visita e outra. Quando notar isso, verá que são as visitas que bagunçam sua casa, não você. Usam seus copos favoritos, mudam a ordem das almofadas, comem o bolo que você guardou pra lanchar no domingo à tarde e depois se vão.

Na hora de arrumar a casa pra próxima - depois que você já entendeu que isso é necessário - talvez você note que a ordem das almofadas te agrada mais da forma como a última visita deixou e nem mexa nela. Outro visitante pode trocar a cor das suas cortinas e você gostar. Um posterior pode acrescentar um mensageiro do vento à sua varanda. Ou aquele que ficou por uns dias pode te fazer gostar de tomar tudo em xícaras, de água à cerveja. E o último - quase certo que será o que sabe sobre seus produtos de limpeza e preferência sobre móveis - vai gostar das mudanças que os outros fizeram e entender elas como parte de você agora.

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